“Temos de popularizar a nossa modalidade”

Roberto Ramos, nome incontornável do BCR brasileiro, reside em Portugal há dois anos e associou-se à AD Vagos para fundar uma equipa na região

FPB
31 MAR 2020

O currículo de Roberto Ramos ilustra a dimensão do seu vínculo com o basquetebol em cadeira de rodas (BCR) e o espírito dinâmico que lhe proporcionou contribuir para momentos pioneiros na modalidade do seu país natal, que abarca cerca de 100 equipas. No vasto rol de honras e títulos, destacam-se a participação em quatro Jogos Paralímpicos (Heidelberg 1972, Toronto 1976, Arnhem 1980 e Seul 1988), o bronze alcançado em três edições dos Jogos Parapan-americanos, as várias aparições com medalha nos embrionários Jogos de Stoke Mandeville ou o pentacampeonato brasileiro ao serviço do CPRJ. Os méritos fora do campo nada ficam a dever ao trajeto invejável como atleta. Roberto foi o selecionador da primeira seleção feminina brasileira, em 1978, tendo pouco depois, em 1981, enveredado pela carreira da classificação funcional. Em 2005, fundou a Federação de Basquete Adaptado do Estado do Rio de Janeiro e, prova da sua versatilidade, comentou, na SPORTV (Brasil), as competições de BCR dos Jogos Paralímpicos de Pequim 2008, Londres 2012 e Rio 2016. Em Aveiro há dois anos, aos 66 de idade, Roberto Ramos sentia falta de uma equipa de BCR na região e materializou o seu desejo na AD Vagos, onde desempenha as funções de treinador-jogador. 

O que te motivou a formar uma equipa de BCR em Aveiro?
Sou “basqueteiro” desde adolescente. Após me instalar aqui em Vagos, procurei logo por um clube ou associação que desenvolvesse o desporto paralímpico, independentemente da modalidade, e não encontrei. Então, procurei saber onde se jogava basquetebol. Encontrei o Pavilhão Municipal de Vagos, local onde a AD VAGOS desenvolve as suas atividades, e abordei o presidente Mário Rocha, apresentei-me e falei um pouco sobre minha carreira internacional na modalidade, sugerindo iniciar a criação de uma equipa. Ele comprou a ideia.
Como tem sido o processo de recrutamento de atletas?
Por não haver nenhuma equipa, imaginei que essa tarefa seria fácil. Enganei-me completamente. Aqui, em Portugal, é muito difícil convencer a pessoa com deficiência a praticar desporto. Contactámos com 13 possíveis atletas, conseguimos motivar cinco, entre eles uma feminina, mas apenas três ficaram. Eu queria logo montar uma equipa para disputar o Campeonato da 2.ª Divisão e o processo de formação de um atleta leva muito tempo. Comecei a procurar por ex-atletas de basquetebol e andebol e encontrámos mais três que se dispuseram a voltar a praticar desporto. Ainda faltavam atletas, então fizemos um protocolo com a APD Lisboa, que nos emprestou três atletas, todos brasileiros.
Notas alguma diferença, entre Portugal e Brasil, na forma de encarar a deficiência e o desporto?
Sim. Existe nas pessoas ditas fisicamente normais um certo grau de preconceito com as pessoas com deficiência. Quando fazemos um convite, a pessoa não se sente capaz de ser um atleta, muitos riem do convite e indagam: “Mas como ser um atleta? Isso não é para mim”. Às vezes, até se emocionam e dizem que vão pensar. Além disso, ainda temos o sério problema da mobilidade. Infelizmente, é quase zero. É um somatório negativo de muitas variáveis a que se junta a falta de apoio de empresas públicas e do governo.
Quais os objetivos a médio prazo com a AD Vagos?
Estamos muito motivados. Criámos a AD Vagos Núcleo, que pretendemos que tenha um cunho de Centro de Desporto Adaptado, voltado para trabalharmos em toda a região Centro. Estamos em contacto com três associações do Brasil a fim de fazermos intercâmbios, aprofundarmos conhecimentos e aprendizagens para, no futuro, nos aproximarmos aos melhores da Europa, à profissionalização.
Participaste em 4 Jogos Paralímpicos. Atendendo à tua experiência, o que falta a Portugal para subir de patamar no BCR internacional?
Temos de popularizar a prática da nossa modalidade, através de exibições em escolas, faculdades, clubes, e até nas praças, no formato 3X3, competição que a IWBF pretende tornar Paralímpica. Devemos trabalhar para melhorar a estrutura física e administrativa da modalidade, possibilitando o surgimento de mais atletas, capacitação de técnicos, árbitros, classificadores e dirigentes. Consequentemente, vão surgir novos elementos para melhorar a estrutura dos clubes, o que produz melhores atletas, promovendo uma evolução das seleções.
FPB
31 MAR 2020

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