Jogadores marcantes #7: António Botelho

Percurso histórico no basquetebol em cadeira de rodas nacional

Atletas | Competições | FPB
25 MAI 2020

Um dos célebres atletas de basquetebol em cadeira de rodas (BCR) da participação nos Jogos de Stoke Mandeville de 1971 e dos Paralímpicos de Heidelberg, em 1972, António Botelho inscreve com propriedade o seu nome no rol de jogadores marcantes.  Entre 1969 e 1993, jogou pelas equipas de Alcoitão, da extinta AFDA (Associação dos Deficientes das Forças Armadas) e da APD Lisboa.

Ligado aos primórdios do BCR em Portugal, António Botelho, paraquedista em Angola, de 1963 a 1965, na guerra do Ultramar, mudou, na ação individual, a ligeireza e o menosprezo com que se olhavam a pessoa com deficiência e o desporto adaptado. Tudo começou no Centro de Medicina e Reabilitação de Alcoitão. “O campo era em alcatrão, com umas tabelas, que nem sequer tinham rede. As atividades foram iniciadas pelo Ângelo Lucas, estudante de fisioterapia”, a quem, entre risos e sem desmerecer o contributo, não reconhecia o grau necessário de competência. “Ele não percebia nada daquilo, nem regras de basquetebol sabia”, conta o antigo poste.
Com ele ao leme, os onze selecionados rumaram a Stoke Mandeville, Inglaterra, em 1971, para disputar os jogos sob a designação da localidade, criados em 1948, por Sir Ludwig Guttmann. Na pátria do movimento Paralímpico, “onde se viam ainda as casernas da II Guerra Mundial”, António Botelho relata o espanto que perpassou o grupo perante a naturalidade desconcertante no modo de se encarar a deficiência. “Nunca tive muitos complexos, mas aí fiquei totalmente desinibido. Aprendi muito com os deficientes estrangeiros, eram autênticos profissionais”, circunstância que atribui aos “bons técnicos, melhores condições de treino e apoios”, apesar de enaltecer o auxílio dos primeiros tempos a esta inédita formação portuguesa. “Fomos na TAP para Stoke Mandeville. Para Heidelberg, fomos num avião militar, só para nós”, relembra.
No plano desportivo, ambas as aparições internacionais produziram episódios insólitos, decorrentes da impreparação da equipa técnica, que o corpulento ex-atleta se vê forçado a sublinhar. “Em Inglaterra, cometi uma violação de meio-campo. Era elementar e nem isso sabíamos. Fiquei parvo a olhar para o árbitro”. No ano seguinte, em Heidelberg, a contestação ao conhecimento incipiente do técnico gerou uma resolução coletiva inusitada. “Corremos com o treinador em plena competição. Mandamo-lo para a bancada!”, decisão que, afiança, proporcionou a única vitória portuguesa, frente à Suíça.
Apesar dos dissabores competitivos, a primeira experiência além-fronteiras, em Inglaterra, permitiu vislumbrar uma realidade contrastante com a invisibilidade imposta em território nacional, até mesmo no centro de Alcoitão. “Cá, escondiam os deficientes. Havia um triciclo, com as rodas vazias, e não deixavam que se usasse, precisamente para não se verem as pessoas. Mas consegui encher os pneus e andar. Revolucionei um bocado aquilo”, regozija-se.
Competidor acérrimo, distinguia-se pela dominância na área restritiva, capacidade física e passe fácil, herança parcelar do passado no futebol e boxe. Tinha “um bom relacionamento com todos os jogadores”, inclusive adversários, mas no campo a vontade insaciável de se superar chegou a provocar algum desagrado. “Uma vez, ganhámos 60-0 ao GDR “A Joanita”. Acusaram-me de abusar da fraqueza deles. Eu disse que tinha dado 60, mas se pudesse dar 70 ou 80, dava. Era muito rigoroso comigo próprio”, explica. No lote dos que o embeveciam, recorda Vilarinho, “o único a marcar de três pontos”, Delgado, “muito habilidoso e rápido”, e Morais, “telefonista em Alcoitão” e irmão do futebolista João Morais, obreiro da conquista sportinguista da Taça das Taças, em 1964.
No ativo até 1993, então com 55 anos, equacionou as funções de treinador, mas abandonaria em definitivo o “vício do cesto”. Em anexo podem consultar o testemunho de Jorge Almeida, técnico do Sporting CP-APD Sintra, ex-treinador e jogador da APD Lisboa e Seleção Nacional.

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25 MAI 2020

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