Clara Silva: “Estou focada na universidade e, se tudo correr bem, espero chegar à WNBA.”
A atleta de 18 anos estreia-se na NCAA
Atletas | Seleções
1 JUL 2024
Depois de cinco anos em Espanha, Clara Silva vai mudar-se para os EUA e estrear-se na NCAA. Em entrevista a Ricardo Brito Reis, a poste de 18 anos faz um balanço dos anos no Unicaja, conta como decorreu o processo de recrutamento que terminou com a escolha de Kentucky e revela a ambição para o Campeonato da Europa de Sub18, que terá lugar em Matosinhos.
Já levas alguns anos no Unicaja Málaga, em Espanha. Fala-nos dessa decisão de sair de Portugal para investires numa carreira no basquetebol.
Ir para Espanha foi uma boa decisão em termos basquetebolísticos, mas também a nível pessoal. Aprendi muito. Tive a oportunidade de jogar com as seniores, contra jogadoras mais físicas, mais fortes, e isso também me tem ajudado na minha evolução. E a oportunidade de ter os meus pais por perto ajudou à minha adaptação. É óbvio que tinha saudades da família e dos amigos, mas estava a quatro horas de viagem. Mas a minha mãe esteve em Espanha comigo e o meu pai trabalha em Portugal, mas ia todos os fins de semana para estar connosco.
Isso dá-te um suporte diferente. Sabe bem ter a comida da mamã, todos os dias?
Sim, sempre! [risos]
Como é que foi crescer numa casa com tanto basquetebol?
Foi muito natural. Os meus pais jogaram e foram nossos treinadores quando eu e o meu irmão éramos mais novos, mas todos nós conseguíamos separar bem as coisas.
E a ligação com o teu irmão Hugo? Jogavam um contra um? Havia picardias enquanto cresciam?
Por acaso nós nunca jogámos um contra um, mas ele sempre me deu dicas, sempre me ajudou com tudo. Como é mais velho, sempre me ajudou.
Como é que era o teu dia a dia no Unicaja?
Tinha treinos logo de manhã. Uma hora de lançamentos ou técnica individual, e depois mais uma hora de ginásio. Depois de almoço tinha aulas até às 5 e ia treinar outra vez. Mais duas horas de treino de equipa, fazia ginásio e depois ia para casa, para estudar, jantar e descansar.
Entre técnica individual, treino com a equipa e ginásio, treinavas sempre mais de cinco horas por dia?
Sim. Por aí, sim.
Nesses treinos individuais, fazias trabalho apenas específico e mais especializado para a tua posição ou trabalhavas de tudo um pouco?
Eles queriam que eu trabalhasse tudo, jogo interior e exterior. Isso é muito importante.
E como é que isso se traduz para os jogos?
Joguei dentro, mas por vezes partilhava o campo com outra jogadora da posição 5 e eu passava a 4.
Como é feito o planeamento desse trabalho técnico? Há reuniões no início da temporada em que te é explicado o que é que vai ser feito ao longo da época e dizem-te quais são as áreas positivas que tens que consolidar e aquelas em que tens que melhorar?
Sim, é-nos dito o que é que esperam de nós, o nosso papel dentro da equipa, o que é que querem que nós melhoremos. Por exemplo, este ano o meu objetivo foi melhorar a nível físico, ficar mais forte.
E do ponto de vista técnico? Faz-nos um scouting report da Clara Silva.
A Clara joga bem no poste baixo, sabe passar a bola desde poste baixo e o seu movimento favorito é o fadeaway. Não gosta muito de jogar com contacto…
Em termos de lançamento, tens trabalhado o tiro exterior ou só te sentes mais confortável na meia distância?
Eu prefiro meia distância. Os últimos triplos que lancei em jogo foi porque o meu treinador me obrigou, literalmente, mas se estiver completamente sozinha vou lançar.
O basquetebol tem uma acção que está presente em todos os jogos que é o bloqueio direto. Hoje pede-se aos jogadores grandes que, na defesa do bloqueio direto, sejam capazes de entrar num esquema de trocas e defender no perímetro. Estás confortável nesse aspecto?
Tenho algumas dificuldades nas trocas. No Unicaja, tentámos fazer sempre 2 contra 1, mas tenho-me sentido cada vez mais confortável a fazer trocas e a defender jogadoras mais baixas e mais rápidas.
Este ano vocês tinham subido à LF Challenge (segundo escalão espanhol) e tu acabas de fazer 18 anos. Já na época passada, ainda com 16 anos, estavas a jogar em séniores, na LF2 (terceiro escalão). Chegaste a ser MVP de uma jornada e eras uma das figuras da equipa. Este ano, mesmo com a subida à LF Challenge, não se notou uma grande diferença no teu rendimento, ou seja, subiste um nível competitivo e não tiveste uma quebra. Sentiste alguma diferença da LF2 para a LF Challenge?
É uma liga muito mais física, com jogadoras muito mais experientes. Mas o objetivo do clube é fazer uma equipa para subir à LF Endesa com jogadoras que vêm da formação e isso dá-nos muita confiança. Jogamos com colegas que conhecemos há muitos anos, da nossa idade, e isso é bom.
Também foste MVP de uma jornada da LF Challenge, já esta época. Como é que recebeste essa notícia?
Eu tento não pensar muito nisso e não me focar-me muito nisso. Eu penso mais na equipa e deixo a parte individual de lado, mas é óbvio que fiquei feliz.
Mas sentes que é uma validação do trabalho que tens feito?
Sim, sem dúvida.
Este ano a tua grande prioridade foi melhorar do ponto de vista físico. Esse trabalho deu resultados?
Sim, todos os anos eu tenho evoluído a nível físico. Trabalhei muito mais o físico em Espanha do que trabalhava em Portugal, por exemplo. Todos os dias ia ao ginásio. Mesmo em Sub-14. Isso tem-me ajudado bastante e é muito importante para uma jogadora interior, como eu.
Na LF Challenge, tiveste a possibilidade de defrontar outras portuguesas e até o selecionador nacional. Como foi essa experiência?
É sempre bom encontrar portugueses por aqui. A pessoa com quem mais falei foi a Jusse (Josephine Filipe).
Este é o teu último ano em Espanha, uma vez que vais para a NCAA. Era um sonho para ti?
Sempre foi um sonho. Não sei porquê, mas sempre quis estudar e jogar lá.
Que conselhos é que o teu irmão Hugo te deu da experiência dele nos Estados Unidos?
Eu não posso pensar muito na experiência dele, porque é diferente. Ele foi para uma universidade no meio do nada e não tinha muitas informações sobre a universidade. Eu tive a oportunidade de ir visitar algumas universidades, conhecer os treinadores e parte da equipa. Ele foi um bocadinho às cegas. A parte mais importante para mim foi encontrar um ótimo treinador, com um ótimo staff.
Sentes que te podes adaptar rapidamente e ter bom rendimento em campo porque não tens de te preocupar com o que está fora do campo.
Exato.
Como foi a viagem com os teus pais aos Estados Unidos para conhecer as várias universidades que estavam interessadas em ti?
Depois do Europeu de Matosinhos, há dois anos, comecei a falar com universidades. Perguntaram se eu tinha interesse em ir para os Estados Unidos, os treinadores explicaram o tipo de jogo e como é que eu podia encaixar dentro da equipa. Cada equipa tem um tutor e também falámos com esses tutores. Explicaram-nos as ajudas que dão às atletas. Por exemplo, quando há jogos fora, os tutores viajam com a equipa para conseguirmos fazer todos os trabalhos e não deixarmos nada para trás.
E, portanto, essas universidades ofereceram-te bolsas, disseram que estavam disponíveis para te receber e depois agendaste uma viagem com os teus pais para visitar as várias universidades. O que é que tu e os teus pais esperavam ver?
Fomos de mente aberta. O mais importante era encontrar um sítio em que eu me sentisse bem, um ambiente familiar ao pé de treinadores, staff, colegas de equipa, tudo. Isso era o fator mais importante da minha escolha.
Visitaste universidades cotadas, quer do ponto de vista desportivo, quer em termos académicos. O que é que mais te surpreendeu nessas visitas?
Tudo: os pavilhões enormes, o staff, a seriedade com que levam os estudos e o basquete ao mesmo tempo, o sítio onde vou ficar a viver. É tudo incrível.
E como é que tomaste uma decisão? O que é que tiveste em linha de conta que te fez optar por uma em detrimento das outras?
O treinador e o staff foram o fator mais importante. Qualquer universidade era uma boa escolha em termos de condições, mas o fator mais importante foram mesmo os treinadores.
O teu futuro treinador tem um currículo invejável, com presenças em Final Four e jogadoras que acabaram por ir para a WNBA. Como é que tu te imaginas daqui a cinco anos?
A WNBA sempre foi o meu sonho, mas eu gosto de pensar pouco a pouco. Agora estou focada na universidade e, se tudo correr bem, espero chegar à WNBA.
O teu sonho é a WNBA, mas a WNBA tem uma temporada curta e muitas jogadoras acabam por fazer boa parte do ano na Europa. Ajudaste o Unicaja a subir à LF Challenge, mas nunca jogaste na LF Endesa (primeiro escalão espanhol). É algo que queres?
Sim, eu gostava muito de voltar a jogar em Espanha, no Unicaja. Eles querem subir à LF Endesa e eu gostava muito de voltar a Espanha. É um país muito parecido com Portugal e eu adaptei-me bem.
Este verão temos novamente um Europeu em Matosinhos.
A Federação está a apostar bastante nas seleções e nós temos tido resultados cada vez melhores. É muito bom a Federação continuar a confiar em nós para jogarmos em Matosinhos e em Portugal.
Que expectativas é que tens para este Europeu?
Ganhar. Com público a ajudar-nos, vai ser muito positivo.
Sentes uma pressão acrescida pelo facto do Europeu ser em Portugal?
É uma pressão positiva. O público quer o melhor para nós e sentirmos o público a apoiar-nos nos bons e nos maus momentos é muito importante.
O teu desenvolvimento nas seleções é um objetivo e, passo a passo, quererás chegar certamente à seleção sénior. Tens esse sonho de chegar à seleção sénior e de ser a poste do futuro da seleção nacional?
Sim, sem dúvida.
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