Raquel Laneiro: “Desde os 12 anos que queria ser profissional”
Ricardo Brito Reis esteve à conversa com a internacional portuguesa

Atletas
16 MAR 2025
Raquel Laneiro é sinónimo de intensidade, confiança e paixão pelo jogo. Desde os tempos em que não saía do pavilhão aos fins de semana, com a bola debaixo do braço à espera dos intervalos para lançar ao cesto, até à afirmação como jogadora profissional, a base portuguesa tem construído um percurso sólido, sempre em busca de desafios que a façam crescer. Depois de passar pela Liga Betclic e pela Islândia, está a viver o sonho de jogar em Espanha. Nesta entrevista, fala das suas raízes, da experiência internacional e da emoção de ajudar Portugal a qualificar-se, pela primeira vez, para o EuroBasket.
Quero rebobinar a cassete até à altura em que tinhas 8 anos, em 2008. Quais são as memórias que tens desses primeiros tempos em que começaste a brincar com a bola na Escola do Algueirão?
As minhas memórias? Vamos recuar muitos anos… As memórias mais fortes que tenho são de, nos fins de semana, não sair do pavilhão. Via quatro jogos seguidos, muito provavelmente. E era aquela miúda que, quando faltava um minuto para acabar o segundo período, já estava lá em baixo com a bola debaixo do braço para ir lançar, sabes? Essas são as memórias mais marcantes: os fins de semana no pavilhão e os convívios de minibásquete, que na altura ainda eram na Ajuda, uma vez por mês. Íamos todos os sábados treinar já a pensar nesses convívios de minibásquete.
E por que razão é que começaste a jogar?
O meu pai jogou, o meu avô também chegou a jogar, mas nunca houve uma imposição do tipo “Vais jogar basquete”. Eu estava indecisa entre a ginástica e o basquetebol, talvez porque a minha mãe fez ginástica. Se calhar, havia uma influência meio do meu pai, meio da minha mãe. Lembro-me de estar muito indecisa, mas depois mudámos para Rio de Mouro, que ficava perto do Algueirão. Um dia, o meu pai perguntou: “Não queres experimentar? Só um fim de semana, um treino, para ver se gostas?” E eu pensei: “Por que não?” E foi amor à primeira vista! Desde esse momento, não me lembro de fazer mais nada na vida senão jogar basquetebol.
Mas chegaste a fazer ginástica ou não?
Sim, na escola. Na altura, havia essa possibilidade – não era bem desporto escolar, mas podíamos experimentar. O meu professor de Educação Física dizia sempre: “Tens aptidão, porque não tentas?” E eu experimentei. Gostava muito, mas ainda não tinha experimentado o basquetebol. Esse foi o erro! Quando experimentei o basquetebol, esquece… não havia outra coisa na minha cabeça.
E então começas ali no Algueirão, depois na Maria Alberta Menéres, e tens uma parte muito importante da tua formação no CB Queluz.
Quando fui para o Queluz, já tinha uns 15 ou 16 anos e já tinha essa ideia de que era um clube familiar. Acho que isso se devia ao facto de, comparativamente a outros clubes com mais estrutura e condições, as pessoas se unirem ainda mais. Muitos pais tinham disponibilidade para ajudar. O meu pai, por exemplo… Quando cheguei ao Queluz, as miúdas já estavam juntas há muito tempo, desde pequenas. O clube sempre trabalhou muito bem a base, para que os jogadores não saíssem e se sentissem bem ali. Isso criou um ambiente de família. Eu senti-me muito bem porque, quando saí do Algueirão, também existia esse espírito lá. Por isso, a minha adaptação ao Queluz não foi difícil. São dois clubes que têm um lugar muito especial no meu coração.
E foram os dois clubes que te prepararam para chegares à Liga e teres impacto logo de início. A tua estreia na Liga foi pela União Sportiva, uma equipa habitualmente candidata ao título, com um grande investimento do Governo Regional dos Açores. Quais foram os principais desafios nesses anos no Sportiva?
São cenários diferentes, claro. Mas desde o Algueirão, houve um período em que não havia equipa feminina, e foi por isso que saí para o Queluz. Joguei juniores e seniores com 14 anos. Depois, no Queluz, a minha última época foi também juniores e seniores, e foi o ano em que a equipa subiu da 2.ª para a 1.ª Divisão. Ou seja, já estava habituada a jogar contra pessoas mais velhas e experientes. A nível de qualidade, a Liga estava muito competitiva quando fui para o Sportiva – foi o ano do Covid. E, claro, houve um período de adaptação. No início, senti receio: era o meu primeiro ano de sénior e estava a ir para uma equipa candidata ao título. Mas também senti muita ilusão e vontade de aprender. Tive sorte nesse ano porque tive companheiras de equipa que me ajudaram muito. Tínhamos americanas de grande qualidade e, na minha posição, estavam a Joana Ferreira, com 30 anos, e a Miriam McKenzie e a Aliyah Collier. Lutar por minutos com elas não era fácil, mas treinar todos os dias contra algumas das melhores americanas ajudou-me a crescer muito. Foi um dos passos mais importantes da minha carreira.
Falaste de um ponto interessante: passar de jogar muitos minutos na formação para, de repente, lutar por minutos com jogadoras estrangeiras. Para uma jogadora talentosa, que sempre teve a bola na mão e foi peça central nas equipas de formação, essa transição pode afetar a confiança. Como lidaste com isso?
Nunca tinha pensado nisso dessa forma. Claro que senti a diferença, mas de uma forma saudável. Sempre tive um bom acompanhamento de treinadores, colegas e família, e nunca senti pressão externa. A maior pressão vinha de mim mesma. Havia expectativas, claro, mas sempre lidei mais com as expectativas que eu própria tinha do que com as dos outros. Nunca me incomodou deixar de ser o centro das atenções. Sempre tive os pés assentes na terra. Acreditava que, se continuasse a trabalhar, a manter-me humilde e fiel aos meus valores, as coisas iriam correr bem – e, se não corressem, também estaria tudo bem. O meu primeiro ano no Sportiva foi, acima de tudo, a realização de um sonho. Desde os 12 anos que queria ser profissional em Portugal. O Sportiva foi, sem dúvida, um palco muito importante para o início da minha carreira profissional. É um clube ao qual estou muito grata, porque me deu a oportunidade de crescer, tanto como jogadora como pessoa, já a nível sénior. É um clube que te dá a oportunidade de experimentar a vida profissional dentro de Portugal e que tenta sempre oferecer as melhores condições para que possas dar o teu melhor. Queria viver essa experiência, perceber se era esse o caminho que queria seguir. Sempre fui aquela jogadora que pensa: “Vou fazer o meu trabalho, dar o que a equipa precisa, aprender com cada uma das minhas colegas”. E continuo a ser assim. Acredito que podemos aprender todos os dias – seja com uma colega de equipa, uma adversária ou qualquer outra jogadora que vejamos jogar.
Nunca referes que te questionaste ou que tiveste dúvidas. Falas sempre numa perspetiva de encarar qualquer desafio – mesmo em alturas em que podias não jogar tanto – como uma oportunidade para tirar algo positivo. Nunca, em nenhum momento, mesmo agora a falares comigo, demonstras qualquer tipo de dúvida. Mas essas dúvidas existiram ou não?
Claro que existiram. Acho que existem e vão existir sempre. Não importa quantos anos passem, esse tipo de dúvidas vai sempre surgir, porque a vida de um atleta profissional não é linear. Há momentos altos e baixos. Há dias em que te sentes superconfiante e outros em que as coisas não estão a correr tão bem e questionas-te: “Será que estou ao nível do desafio que tenho agora?”, “O que é que não está a correr bem?”, “Porque é que há duas semanas fiz um grande jogo e esta semana não acerto um lançamento?”. Mas, sinceramente, é o trabalho diário e a exigência que tenho comigo mesma que me permitem lidar com esses momentos. Claro que, às vezes, há aquela vozinha na cabeça a dizer: “Não estou a dar o que posso”, “Será que sou suficientemente boa para estar aqui, para este nível?”. Mas depois respiro fundo e digo a mim mesma: “Tranquila. Já passaste por isto antes, já superaste, e vais voltar a superar”. Sei que esses momentos vão continuar a surgir, mas tento manter-me calma e positiva, porque sei que consigo ultrapassá-los.
Insisti nesta questão porque quem te vê a jogar vê sempre a Laneiro com aquele ar superconfiante, com aquele swag, com a atitude de quem, mesmo depois de falhar cinco lançamentos, vai lançar o sexto sem hesitar. Essa é a imagem que passas para o exterior. Tens noção de que é essa a perceção que as pessoas têm de ti?
Já algumas pessoas me disseram isso, mas não é nada forçado, sabes? Não é algo que eu planeie, é simplesmente natural. Acho que não nasci com isso, mas quase. Durante o meu crescimento no basquetebol, ouvi muitas vezes que, se eu mostrasse insatisfação, frustração ou falta de confiança, isso facilitaria a vida das minhas adversárias. Então, tento sempre ter isso presente. Mas, obviamente, não estou sempre superconfiante, nem sempre penso “vai entrar”. Tento é colocar essa mentalidade na minha cabeça porque sei que é necessária.
Houve algum treinador ao longo da tua formação que te incutiu essa competitividade e que, inconscientemente, te ajudou a construir essa confiança?
Digo sempre que tive a sorte de passar pelas mãos de bons treinadores e de ser naturalmente muito exigente comigo mesma. Mas o facto de os meus treinadores também terem sido exigentes comigo ajudou-me muito. Nunca levei essa exigência como algo negativo. Pelo contrário, sempre pensei: “Se estão a exigir de mim, é porque acreditam que tenho capacidade para dar mais e fazer melhor”. Isso preparou-me para lidar com os momentos difíceis. O Fernando Brás, sem dúvida, teve um papel fundamental nisso. A educação desportiva que ele transmite é a imagem dele, e a geração do Queluz que foi campeã nacional com ele refletia muito essa identidade. Todas nós éramos muito a imagem dele, sem dúvida.
Depois dos Açores, foste para a Islândia, que não é um destino muito comum para jogadoras portuguesas. Como foi essa transição para uma cultura, um clima e um basquetebol tão diferentes?
No meu terceiro ano no Sportiva, já tinha algumas dúvidas sobre se ia ficar ou não. Acabei por ficar e não me arrependo, mas foram três anos que me deram a certeza de que queria seguir esta vida enquanto fosse possível. Na altura, comecei a falar com agentes, assinei com um e ele começou a procurar opções. Acabei por escolher a Islândia e, curiosamente, voltei a jogar com a Aliyah Collier, que já tinha sido minha colega no Sportiva, e com a Lavínia (da Silva), com quem tinha jogado na Seleção. Isso ajudou-me na decisão, porque era o meu primeiro ano fora de Portugal e sabia que ia estar com pessoas que já conhecia e com quem me sentia à vontade. Era um país completamente diferente, onde teria mais responsabilidade por ser estrangeira, mas o facto de estar com jogadoras que eram quase família deu-me tranquilidade.
Ou seja, tornou a decisão mais fácil. Disseste algo interessante: no terceiro ano do Sportiva, sentiste vontade de procurar um novo desafio. Sentiste o mesmo na Islândia ao fim de dois anos?
Sim, sem dúvida. Isso aconteceu no Sportiva e voltou a acontecer na Islândia, porque sou uma pessoa que está sempre à procura de novos desafios.
Gostas de te desafiar, certo?
Sim, não gosto de me acomodar. Depois do segundo ano na Islândia, onde individualmente tive uma época muito positiva, terminei a época com a sensação de que precisava de dar o próximo passo, subir mais um degrau na minha carreira.
E Espanha já era um destino que tinhas em mente? O facto de existirem muitas jogadoras portuguesas lá, algumas caras conhecidas que te podiam apoiar ou aconselhar, ajudou na tua decisão?
Sem dúvida! Tenho uma frase gravada na minha cabeça desde os 12 anos: um dia, depois de um jogo, a caminho de casa, disse ao meu pai: “Acho que quero ser jogadora profissional de basquete e quero jogar em Espanha”. Sempre foi um objetivo meu. Não sei explicar bem porquê. Talvez por ter visto muitos jogos de lá. Sempre achei que queria jogar em Espanha e trabalhei para isso. Considero o basquetebol espanhol um dos melhores a nível europeu. Curiosamente, nunca tive o sonho de ir para os Estados Unidos, que agora vejo que é muito mais comum. Sempre disse aos meus pais e amigos que queria ficar na Europa. E agora, este ano, foi mais um passo nesse caminho.
E estás atualmente no Arxil, em Espanha, numa liga muito competitiva como a LF Challenge, onde jogam muitas atletas da Seleção Nacional. Todos os fins de semana há sempre algum encontro entre portuguesas, porque há duelos constantes entre equipas com jogadoras de Portugal. Como tem sido esta experiência? Que diferenças há entre a LF Challenge e os outros campeonatos onde jogaste?
É uma liga bastante competitiva. Já tinha falado com algumas jogadoras que passaram por cá ou que ainda cá estavam no ano passado, e todas me diziam: “Qualquer equipa pode ganhar a qualquer equipa”. E é mesmo assim. Comparativamente à liga portuguesa e à liga islandesa, acho que este ano está a ser aquele em que estou a ter mais desafios. Há sempre equipas que, teoricamente, estão num patamar acima, mas até essas têm de lutar muito e suar para ganhar às equipas do meio ou do fundo da tabela. A LF Challenge surpreendeu-me bastante nesse sentido. Está a ser um ano incrível, sinto que estou a crescer muito, a aprender muito. Todos os dias há algo para melhorar, algo que não fiz tão bem e que posso corrigir. É um desafio constante, e isso agrada-me, para ser honesta.
Estiveste três anos em Portugal, “resolveste” o basquetebol Depois foste para a Islândia, “resolveste” o basquetebol islandês, e agora estás em Espanha… estás a tentar “resolver” o basquetebol espanhol?
Ou será o basquetebol espanhol a “resolver-me” a mim? Também pode ser! (risos) Neste momento sinto-me bem nesta liga. Acho que ainda tenho muito para aprender e para crescer aqui. Estou a trabalhar diariamente para atingir o nível que quero e que preciso de ter para ajudar a minha equipa da melhor forma possível. Coletivamente, não tem sido um ano fácil, porque é o primeiro ano do clube nesta liga. Mas, individualmente, o meu foco desde o início foi esse: estar no meu melhor nível para ajudar a equipa a alcançar os objetivos coletivos.
Hoje, com 24 anos, como é que te defines como jogadora? O que diz o teu scouting report?
Diz que a Raquel vai lutar com a mesma energia e garra do primeiro ao último minuto do jogo. Diz que a sua energia pode mudar um jogo. E que, apesar de às vezes parecer um pouco louca, a sua irreverência pode ajudar muito a equipa a ganhar jogos.
É curioso que falaste apenas de questões mentais, mas eu queria um scouting report também do ponto de vista técnico.
Ok… Atualmente, com 24 anos e no Arxil, a Raquel Laneiro tem de ser uma marcadora de pontos. Mas também é uma jogadora que gosta do jogo coletivo. Se precisar de ter a bola na mão para encontrar as minhas companheiras sozinhas e envolver toda a gente no jogo, eu vou fazê-lo sem hesitação. É isso que gosto, é isso que tento fazer. Claramente uma “1-2”, sim. Sei que posso marcar pontos, mas prefiro fazer uma assistência para ganhar um jogo do que marcar um triplo decisivo.
O que te dá mais gozo: jogar em casa e sentir o apoio dos adeptos ou jogar fora e calar o público adversário quando marcas uma grande bola?
Prefiro muito mais jogar em casa e ter o público do meu lado. Sempre fui uma atleta que gosta de sentir que os adeptos estão connosco, que contam connosco. Acho que isso é muito importante, especialmente para os miúdos e miúdas que nos vêm jogar. Eu já fui essa miúda que ia aos jogos, sabes? Então penso sempre: “Como é que eu me sentiria se a minha jogadora preferida olhasse para mim e dissesse ‘bora’?”. Ou se, no final do jogo, eu pedisse uma foto ou um abraço e ela dissesse que sim? Tento lembrar-me disso. Já estive desse lado, já tive esses sonhos e essas vontades. Então, se posso retribuir e dar esse momento a alguém, porque não fazê-lo? Sou uma pessoa de pessoas. E esse calor que sinto dos adeptos dá-me mais energia nos momentos difíceis, quando estou cansada dentro de campo. Olho para o público e penso: “Eles estão aqui. Se eles estão aqui e cheios de energia, então eu também tenho de estar”.
Isso faz a ponte perfeita para falarmos da Seleção Nacional, porque vocês viveram recentemente um momento de grande euforia em Coimbra, com uma ligação fortíssima aos adeptos. Mas, antes de falarmos desse jogo, como foi a tua estreia pela Seleção Nacional Sénior?
Foi incrível. A primeira vez que cantei o hino pela Seleção Sénior… lembro-me de estar a cantar e pensar: “Isto está mesmo a acontecer. Eu estou mesmo aqui. Isto é real”. Sonhei com isto, era um dos meus objetivos. E o mais especial foi ter acontecido em Portugal. Além disso, estou hoje na Seleção com o mesmo grupo de trabalho com quem comecei há seis anos. Isso torna tudo ainda mais fantástico.
Seis anos depois, viveste este grande momento do apuramento para o EuroBasket.
Já passaram umas semanas e ainda não consigo encontrar as palavras certas para descrever o que sentimos. Acho que nunca as vou encontrar. Era algo que Portugal, as jogadoras, as que já passaram pela Seleção e toda uma nação sonhavam há tanto tempo… Poder estar por dentro desse momento e contribuir para esta conquista foi incrível. O orgulho que sentimos… passam mil coisas pela cabeça. Todos os sacrifícios valeram a pena. Lutámos por isto durante anos, e tornou-se realidade. Não é ficção. É real.
E foi um momento de muita emoção. Houve muitas lágrimas… Sofia da Silva, depois de 14 anos na Seleção… Inês Viana, depois das várias lesões gravíssimas… Ficaste particularmente feliz por alguém?
Que pergunta difícil! Acho que fiquei feliz por todas. Claro que mencionaste nomes como a Sofia (da Silva), a Maria João (Bettencourt), a Inês (Viana), a Lavínia (da Silva)… são jogadoras que já estão na Seleção há muito mais tempo do que eu. Mas fiquei feliz por toda a gente. O Ricardo (Vasconcelos) também já está na Seleção há muitos anos. Eu nem me lembro da Seleção Nacional antes do Ricardo! (risos) Não sei explicar. Fiquei feliz por todas nós. Somos um grupo de trabalho muito unido, com muita determinação, muita seriedade, muito sacrifício. As pessoas só veem os festejos, mas houve muito trabalho por trás. Dizer um nome? Não consigo. Estou feliz por todas as pessoas que fazem parte deste grupo.
Conseguiste escapar aos calduços do Agostinho (Pinto)?
Ninguém consegue escapar ao Gusto!
Estavas a dizer que toda a gente vê os festejos, mas ninguém vê o que se passa no “durante”. Conta-nos alguma coisa que quem está de fora não sabe sobre este grupo da Seleção.
Os verões são sempre duros. No verão passado, trabalhámos um mês e meio, semanas intensas. Tivemos a sorte de ir ao Canadá e depois à Polónia, onde jogámos contra seleções que iam aos Jogos Olímpicos, por exemplo. Mas são aqueles momentos em que terminas a época e tens aquela vontade de ir para casa, rever as pessoas de quem estiveste longe durante quase um ano… e, em vez disso, vais para a Seleção. Claro que o facto de sermos um grupo muito unido ajuda, mas o cansaço e as saudades nem sempre são fáceis de gerir. Este verão, trabalhámos com uma ideia clara na cabeça: queremos e vamos estar no EuroBasket 2025. E depois há as lesões pelo caminho… nenhuma lesão é boa. Por exemplo, a Laura (Ferreira) não teve oportunidade de jogar nas janelas de novembro. É uma referência para mim e para muita gente, principalmente dentro deste grupo de trabalho. Mas recuperou e agora estava a ajudar dentro de campo. Isso deixa-me muito feliz. Foi também a primeira vez que partilhei Seleção com a Inês Viana. A energia dela é diferente. Não diria que é “palhaça”, mas está sempre com as suas piadas, e isso faz falta. Em momentos mais tensos, é bom ter alguém que nos faça rir. Mas, no geral, damo-nos todas muito bem, apoiamo-nos muito umas às outras e cuidamos umas das outras.
Ou seja, nesta última janela, agora em fevereiro, jogaram contra a Ucrânia – que tinha a Iagupova – e contra a Sérvia, que ainda não tinha perdido. Era importante não só garantir uma vitória, mas também o cesto average. No jogo contra a Ucrânia, Portugal chegou a ter uma vantagem de 17 pontos, mas no último período as coisas complicaram-se e essa vantagem perdeu-se para apenas uma posse de bola. Depois vinha o jogo com a Sérvia, que até então tinha ganho todos os jogos com facilidade. Houve ali um momento, depois de perder essa vantagem contra a Ucrânia, em que pensaste: “Isto pode não correr bem”?
Sabíamos que era um resultado importante e que, se ganhássemos por mais pontos, melhor ainda. Mas eu acredito que nada acontece por acaso. Se calhar, foi aquele último período contra a Ucrânia foi, na verdade, o que nos deu a vitória contra a Sérvia.
Deixou-vos em sentido?
Foi um alerta. Fez-nos perceber que tínhamos uma responsabilidade e que tínhamos de estar à altura dessa responsabilidade. Por isso, quem sabe se aquele último período contra a Ucrânia não foi o motivo pelo qual vencemos a Sérvia? Fizemos um jogo defensivo exemplar contra a Sérvia, e foi isso que nos deu a vitória. Acreditámos sempre, sempre, sempre que íamos conseguir o nosso objetivo. E concretizámo-lo. Por isso, no fim, correu tudo bem.
O que é que seria, para ti, um EuroBasket de sucesso para Portugal? Tanto do ponto de vista coletivo como individual.
Do ponto de vista coletivo? Para mim, seria ganhá-lo! (risos) Mais a sério, fazer uma boa fase de grupos e ganhar o maior número de jogos possível. Sei que vamos trabalhar para isso e que queremos fazer um percurso digno do que fizemos até aqui. Vamos jogar com responsabilidade, mas também desfrutar do momento, porque merecemos. É um marco histórico para o nosso basquetebol e para todas nós que fazemos parte deste grupo de trabalho. A nível individual, com 24 anos, poder estar aqui e fazer parte deste momento já é incrível. Só quero estar na minha melhor forma para ajudar a equipa a fazer a melhor campanha possível no EuroBasket.
Ao longo desta conversa, foste falando de várias pessoas que te marcaram na carreira: treinadores, colegas de equipa, amigos, família. Quando entras em campo todos os fins de semana, não és só tu que entras. Entram contigo as tuas colegas de formação, os treinadores que te moldaram, a tua família, os teus amigos. Quando defendes o Arxil, quando defendes a Seleção Nacional, quem é que levas contigo?
Uff… Falaste de tanta gente importante para mim… Mas, acima de tudo, a minha família. Eles são o meu motor. Sem o apoio deles, sem eles me permitirem viver o meu sonho, nada disto seria possível. Claro que todas as pessoas que fizeram parte do meu percurso até agora têm um lugar especial para mim. Mas a minha família… essa está sempre comigo. Porque, no final do dia, quando algo não corre bem, quem está lá para mim são eles. Então, para onde quer que vá, eles vão comigo.
Dizias que o teu pai foi quem te desafiou a experimentar o basquetebol, quando ainda estavas na dúvida entre a ginástica e o basquete. Na altura, ele disse-te: “Vamos lá ao Algueirão, experimenta só um treino para ver se gostas”. Hoje em dia, ele não te diz no verão: “Não queres vir cá a casa? O basquetebol tirou-te de mim!”?
Às vezes… (risos) E eu também tenho de ter essa noção e essa responsabilidade. Estou fora o ano inteiro, mal os vejo. Agora sou muito mais consciente disso. Sempre que puder voltar a casa e oferecer-lhes o meu tempo e a minha presença, irei fazê-lo.