Rui Alves: «Ser adjunto de Moncho é uma escola»

Nesta entrevista o treinador, responsável pelo CNT Porto/Paredes e seleccionador de sub-16 fala-nos da geração de jovens jogadores que tem a seu cargo, de como é trabalhar com o treinador espanhol nos seniores e daquilo que pensa sobre o basquetebol nacional.

Formação | Seleções | Treinadores
25 NOV 2009

Habitualmente nos escalões de formação é costume falar-se em “fornadas”. Que se pode dizer desta? É uma geração com pouco tamanho, não tem especial talento mas no outro «T», de trabalho, tem-se mostrado muito empenhada a fim de colmatar as suas limitações. Quais são os critérios, caso existam, de selecção dos atletas para integrar o centro de treino? Claro que existem, e sempre existiram, critérios de selecção. Era fastidioso estar a transcrevê-los aqui, tanto mais que é tão simples de os aceder aqui no Portal (estão em «Documentos Obrigatórios» e de nome «Documento Orientador S16»). Do contacto que tem com miúdos ainda jovens, quais são as principais lacunas, técnicas e tácticas, que destacaria? Os jogadores chegam-nos mesmo muito jovens (13-14 anos) e portanto há que treinar praticamente tudo. Destacaria aquilo que assumimos como prioritário desde tenra idade: não haver pausas de concentração e intensidade durante a actividade. Todos e cada um têm um papel a desempenhar em cada fase do jogo e não há tempo para “chorar” os erros. Na sua opinião, o que nos coloca tão distantes de outros países em termos de resultados nas selecções jovens? Primeiro que tudo, o tipo de prática. A prática federada no nosso país assenta muito mais em modelos de recreação e lazer ou promoção da saúde e muito menos em rendimento desportivo. Não conheço nenhum estudo comparativo recente mas do contacto que tenho com colegas europeus a sensação que me dá é que treinamos muito menos (é certo que temos horários escolares que não facilitam em nada). Depois, o nosso campo de recrutamento é reduzido. Costumo dizer que em Portugal não seleccionamos os melhores, tentamos melhorar os seleccionados (somos 10 milhões, pouco motivados para a prática desportiva de rendimento, cerca de 25.000 praticantes, e as “sobras” do futebol). Depois, a dificuldade do contacto internacional na preparação das competições (pois estamos no início da Europa e só temos uma fronteira terrestre). É certo que, dada a descrição anterior, estamos muito mais susceptíveis aos efeitos geracionais (a tal “fornada”), e agora muito mais porque há competição todos os anos. Contudo, também nos considero distantes de alguns países de “fundo de tabela”. Sinto um orgulho enorme em ver os seniores masculinos na divisão A, os Sub-16 a terem por lá passado há pouco e o resto das selecções no segundo terço classificativo, principalmente porque há 7 URSS’s e 6 Jugoslávias. Defende que deveria existir um modelo de jogo definido para todas as selecções que se adequasse às nossas características físicas? Não penso termos características físicas especiais… Há quem pense que o facto de sermos mais baixos deveria fazer-nos ser mais rápidos… mas o actual recordista mundial dos 100 metros (Usain Bolt) tem 1,96m… e o Francis Obikwelu 1,95m… Depois não defendo a visão clássica dos modelos, do tipo, “Temos de jogar em contra-ataque!”. Qual é a equipa que não procura jogar em contra-ataque? O que eu defendo, e está a ser feito no masculino já com a influência do Moncho López, é adoptarmos um conjunto de princípios/conceitos técnico-tácticos, como senhas de identidade nacional. Por exemplo, como jogar a partir da entrada da bola num poste ou como jogar sem bola numa penetração em drible, entre outros… Comenta-se muito o facto de não surgirem novos jogadores na modalidade, e que não saem atletas dos centros de treino. Concorda com esta leitura tão reduzida da realidade? Essa leitura não é reduzida, é caluniosa… Vamos a factos. Remeto-me apenas ao nosso CNT Porto/Paredes e das gerações com que começámos a trabalhar em 2002, ou seja, a “fornada” nascida em 1988, 89 e 90 (porque os seguintes ainda são sub-19). Temos actualmente na LPB 11 ex-jogadores. Dá para formar uma equipa… E podemos juntar mais 3 que estão a jogar em Espanha. Da mesma geração, jogam apenas 4 na liga que não passaram pelos CNT’s. Entretanto já se estrearam na selecção sénior o José Silva (Barreirense) e o Fábio Lima (Illiabum), ambos ex-CNT Porto/Paredes. Mais, na última selecção nacional Sub-20, 8 dos 12 jogadores são nossos ex-CNTeiros, como carinhosamente apelidamos. E temos os que jogam na Proliga, CNB1, outros que estão a acabar licenciaturas em medicina, fisioterapia, economia. Esta é a verdade dos factos para quem quiser ver. Digo isto com vaidade mas não por vaidade, porque o sucesso do nosso CNT depende de muitas pessoas, a começar na direcção da FPB e do DTN, pela visão e aposta no modelo que melhor serve ao desenvolvimento do basquetebol de rendimento no país. Treina jovens e colabora com a Selecção Nacional Sénior. O prazer que tem é equivalente, ou são complementares para si? Ser adjunto do Moncho López é uma escola de como ser um bom treinador principal. O seleccionador dá-me muitíssima responsabilidade e confiança. É um enorme prazer fazer parte desse grupo de trabalho. Também é justo dizer que adoro o ambiente familiar de um CNT, e com um adjunto como o Hugo Matos tudo se torna ainda mais agradável. Mas devo dizer, e acho que nunca o fiz publicamente, que o maior prazer que sinto enquanto treinador é o reconhecimento que os jogadores da selecção sénior demonstram face ao meu trabalho; e a entrega absoluta dos meus rapazes do CNT ao longo de semanas… sei que não é fácil. Será uma das pessoas indicadas, e provavelmente mais habilitadas, para responder a uma questão que tem sido muito escutada nos últimos anos. Que o problema do basquetebol português está nos treinadores de formação. Será só isso ou o atleta também não terá a sua quota parte de falta de comprometimento com a modalidade? A única habilitação que encontro em mim é o facto de estar dos dois lados… Primeiro, acho que a formação de um jogador não tem data e hora para acabar. Um jogador tem de aprender tudo entre os 15 e 20 anos de idade para depois, até aos 32, só jogar? Acho que não. Depois, compreendo que os treinadores de formação estão no fim da “cadeia alimentar”, logo mais susceptíveis a esse preconceito. Mas atenção, não tenho dúvidas que muitas soluções para o basquetebol português estão nos treinadores (de formação incluídos). Agora, não consigo concordar com o imputar de responsabilidade aos atletas, subjacente na formulação da pergunta. O jovem português está mentalmente preparado para fazer sacrifícios? O jovem português está preparado para fazer o que o seu treinador lhe pedir, lhe demonstrar. A atitude do treinador e o exemplo que a mesma traduz são, na minha opinião, a chave para preparar os jogadores. Quais os objectivos e as prioridades definidas para este ano de trabalho? No que diz respeito à selecção sénior, continuar o acompanhamento dos jogadores na nossa liga e no estrangeiro e preparar os relatórios audiovisuais para o seleccionador. Quanto ao CNT Paredes, continuar a trabalhar para que a maioria dos jovens possam vir a integrar a selecção sub-16, a curto prazo, e desenvolver as suas capacidades para que possam um dia vir a representar a selecção sénior.

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25 NOV 2009

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